Dando sequência ao assunto Estilo, o
maestro tece considerações sobre arranjos e efeitos, assunto por demais
discutido no meio coral. Aos que começaram a leitura das reflexões hoje, sugiro
que leiam os posts dos dias anteriores.
Reflexões
em torno de elementos básicos da Regência Coral
Muito cuidado com ARRANJOS. Ao
fazê-los, ou ao escolher um para seu coro, pode acontecer (e acontece muito)
que o pecado contra o estilo já esteja no próprio arranjo. E, caros colegas, muito
cuidado com os “efeitos gratuitos”. É preciso muito cuidado para que os “efeitos
corais” não sejam GRATUITOS; não sejam elementos falseadores do estilo, sem
nexo com a peça, tanto em relação ao texto quanto à estrutura. Um “efeito
gratuito” pode mesmo quebrar a estrutura de uma peça ou destruir o sentido do
texto poético/literário que o coro está cantando. Exemplo de “vítima” constante
de “efeitos gratuitos” são os negro
spirituals. É certo que os coros norte-americanos, principalmente os
negros, têm uma gama de cores, acentuações dinâmicas e agógicas, que
significam, em alguns casos, uma rica palheta de efeitos corais. Mas é tudo
dentro de uma espontaneidade viva, “está no sangue”, como está o samba e a
ginga de uma batucada para uma sambista da Portela ou da Mangueira. Os efeitos
acentuam o sentido do texto, o sabor das síncopes, o “swing” do estilo jazzístico.
É preciso ouvir, se possível ao vivo, ao menos as gravações dos bons conjuntos
americanos. Porque, digamos francamente, tem gente fazendo “efeitos”, que “não
estão com nada”; cortes bruscos, acentos exagerados, muitas vezes piorados pelo
famigerado “ataque por baixo”... (atacar por baixo é, “em última análise”,
atacar numa afinação mais baixa, atingindo a nota certa por uma “escorregada”,
isto é, “glissando” ou “portando” ascendentemente, vício que muitos cantores
desavisados fazem até sem perceber... O ataque por baixo é companheiro de outro
vício igualmente péssimo que é o “portamento gratuito” que é fazer um “glissando”
em cada intervalo descendente. No “ataque por baixo” a escorregada é “de baixo
para cima” e, no “portamento”, de “cima para baixo”). Afinal, são vícios insuportáveis,
que surgem em corais onde não há um mínimo de cuidado com a qualidade do
trabalho. Tanto no caso dos “spirituals”, como no da Renascença, ou qualquer
outro estilo, ouvir boas gravações ajuda, e muito. Não no sentido de copiar,
mas para aprender. Meus amigos: - (e agora falo principalmente para os jovens
colegas que se iniciam na regência) todos nós nos apaixonamos, dirigindo vozes,
pela “mágica do som”, por essa facilidade em tirar efeitos das vozes, por essa
possibilidade fantástica que o coro, uma vez “em nossas mãos”, oferece em matéria
de matizamento, plasticidade sonora, efeitos, enfim. Mas, cuidado. É preciso
nos questionar sempre para não falsearmos a mensagem autêntica, o estilo, a
época, o autor. Para acharmos a verdade da música, a seriedade, o estudo e a simplicidade
são essenciais.
Atenção, pois, com o “efeitismo”,
tentação que pode nos levar para uma falsa trilha, mesmo porque o grande
público pode ser seduzido pelo seu brilho fácil (falso) e incentivará esse “efeitismo”
na medida em que o regente for hábil, musical, e o coro reproduzir seus gestos
em surpresas sonoras que causem admiração e aplauso. Só que então, “ESTAREMOS
NOS SERVINDO DA MÚSICA, MAS NÃO A ELA...”
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