terça-feira, 8 de setembro de 2015

Reflexões de Carlos Alberto Pinto Fonseca (4)


Dando sequência ao assunto Estilo, o maestro tece considerações sobre arranjos e efeitos, assunto por demais discutido no meio coral. Aos que começaram a leitura das reflexões hoje, sugiro que leiam os posts dos dias anteriores.

Reflexões em torno de elementos básicos da Regência Coral
            Muito cuidado com ARRANJOS. Ao fazê-los, ou ao escolher um para seu coro, pode acontecer (e acontece muito) que o pecado contra o estilo já esteja no próprio arranjo. E, caros colegas, muito cuidado com os “efeitos gratuitos”. É preciso muito cuidado para que os “efeitos corais” não sejam GRATUITOS; não sejam elementos falseadores do estilo, sem nexo com a peça, tanto em relação ao texto quanto à estrutura. Um “efeito gratuito” pode mesmo quebrar a estrutura de uma peça ou destruir o sentido do texto poético/literário que o coro está cantando. Exemplo de “vítima” constante de “efeitos gratuitos” são os negro spirituals. É certo que os coros norte-americanos, principalmente os negros, têm uma gama de cores, acentuações dinâmicas e agógicas, que significam, em alguns casos, uma rica palheta de efeitos corais. Mas é tudo dentro de uma espontaneidade viva, “está no sangue”, como está o samba e a ginga de uma batucada para uma sambista da Portela ou da Mangueira. Os efeitos acentuam o sentido do texto, o sabor das síncopes, o “swing” do estilo jazzístico. É preciso ouvir, se possível ao vivo, ao menos as gravações dos bons conjuntos americanos. Porque, digamos francamente, tem gente fazendo “efeitos”, que “não estão com nada”; cortes bruscos, acentos exagerados, muitas vezes piorados pelo famigerado “ataque por baixo”... (atacar por baixo é, “em última análise”, atacar numa afinação mais baixa, atingindo a nota certa por uma “escorregada”, isto é, “glissando” ou “portando” ascendentemente, vício que muitos cantores desavisados fazem até sem perceber... O ataque por baixo é companheiro de outro vício igualmente péssimo que é o “portamento gratuito” que é fazer um “glissando” em cada intervalo descendente. No “ataque por baixo” a escorregada é “de baixo para cima” e, no “portamento”, de “cima para baixo”). Afinal, são vícios insuportáveis, que surgem em corais onde não há um mínimo de cuidado com a qualidade do trabalho. Tanto no caso dos “spirituals”, como no da Renascença, ou qualquer outro estilo, ouvir boas gravações ajuda, e muito. Não no sentido de copiar, mas para aprender. Meus amigos: - (e agora falo principalmente para os jovens colegas que se iniciam na regência) todos nós nos apaixonamos, dirigindo vozes, pela “mágica do som”, por essa facilidade em tirar efeitos das vozes, por essa possibilidade fantástica que o coro, uma vez “em nossas mãos”, oferece em matéria de matizamento, plasticidade sonora, efeitos, enfim. Mas, cuidado. É preciso nos questionar sempre para não falsearmos a mensagem autêntica, o estilo, a época, o autor. Para acharmos a verdade da música, a seriedade, o estudo e a simplicidade são essenciais.

            Atenção, pois, com o “efeitismo”, tentação que pode nos levar para uma falsa trilha, mesmo porque o grande público pode ser seduzido pelo seu brilho fácil (falso) e incentivará esse “efeitismo” na medida em que o regente for hábil, musical, e o coro reproduzir seus gestos em surpresas sonoras que causem admiração e aplauso. Só que então, “ESTAREMOS NOS SERVINDO DA MÚSICA, MAS NÃO A ELA...”

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